Escrito por: Hans Christian Andersen
O Talismã
(Talismanen- 1872)
Um príncipe e uma princesa casaram-se. Estavam felizes, se amavam e queriam manter a felicidade e o amor para sempre. Por essa razão, precisavam encontrar um talismã que garantisse a eles manter essa felicidade. Na verdade, eles não gostariam de ser incomodados por problemas, tristezas, preocupações e tantas outras coisas que podem empanar ou até mesmo arruinar uma felicidade. Não queriam, principalmente, que o amor entre eles acabasse.
Ficaram sabendo que no reino, bem no meio da floresta, morava um eremita, um sábio. Ele poderia aconselhá-los mostrando a ambos qual segredo ou qual amuleto da sorte os ajudaria a manter a tão almejada paz e a manutenção de uma vida eternamente feliz e perfeita.
Encontraram o eremita que ouviu pacientemente toda a história do jovem casal.
Ao final o eremita olhou para eles e disse:
– Vão pelo mundo afora e conversem com todos os casais que puderem. Ao encontrarem um casal que não faça nenhum tipo de reclamação de sua vida matrimonial, peça-lhes um pedacinho de sua roupa íntima. Não importa se for do homem ou da mulher, basta um pequeno pedaço. Guardem esse pedacinho como um precioso tesouro pois ele manterá a felicidade, o amor, a paz e a alegria de vocês para sempre.
O jovem casal ficou muito feliz, agradeceu ao sábio e partiu. Saíram pelo mundo.
Não muito distante dali ouviram dizer sobre um cavaleiro que se considerava muito feliz em seu casamento. Seguiram na direção do castelo desse cavaleiro. Ao chegarem lá, pediram a ele e a sua esposa que confirmassem se eram mesmo felizes em seu casamento.
– Somos sim, mas não temos filhos e isso nos deixa muito tristes.
Certamente esse não seria o casal a quem deveriam pedir o talismã.
Assim, continuaram a sua viagem chegando a uma grande cidade. Pergunta daqui pergunta dali, acabaram por receber a indicação sobre um casal que vivia nas redondezas e eram conhecidos por serem muito felizes. Ele e sua esposa viviam em perfeita harmonia. O casal de príncipes bateu a porta do casal e repetiram a mesma pergunta: vocês são verdadeiramente felizes como se comenta na cidade?
– De fato somos – respondeu o homem – vivemos muito felizes, mas tudo seria melhor se não tivéssemos tantos filhos, quanta dor de cabeça, quanto trabalho eles nos dão!
Nem precisa dizer que esse não seria o lugar para pedir o talismã.
O casal partiu novamente, agora um pouco tristes porque até o momento não haviam encontrado um casal que vivesse uma felicidade perfeita.
No caminho, perguntavam as pessoas que encontravam se conheciam um casal que vivesse uma felicidade perfeita. Já estavam começando a pensar que nunca encontrariam tal casal.
Certo dia, atravessando um campo, ouviram uma flauta e procuraram saber de onde vinha. Um pastor, sentado no chão, tocava para suas ovelhas enquanto descansava. Naquele momento veio se aproximando sua mulher com uma criança ao colo e outra segurando pela mão. Assim que a avistou o pastor levantou-se e saiu correndo ao seu encontro. Abraçou e beijou sua esposa, tomou uma das crianças pela mão e começou a brincar com ela. O menino que seguia sua mãe, estralou os dedos para o cão que veio correndo, latindo e balançando o rabo, pronto para uma brincadeira.
A mulher sentou-se no chão e começou a desembrulhar o almoço que trouxera para seu querido marido, como ela mesma disse.
O pastor ficou muito feliz porque estava com fome. Mas, mesmo assim, deu um pedacinho para o bebê, um outro para o filho e pediu que o dividisse com o cão.
Vendo essa cena, o príncipe e a princesa resolveram se aproximar, desceram de seus cavalos e se dirigiram àquela família.
– Minha esposa e eu achamos que vocês formam um casal feliz, estamos certos?
– Perfeitamente, senhor! Nem príncipes e princesas podem ser mais felizes do que nós.
– Temos então um pedido a fazer para vocês: um de vocês poderia nos dar um pedacinho da roupa debaixo que vocês usam? Posso pagar por ele e muito bem, podem ter certeza.
O casal trocou olhares, suas faces enrubesceram, ficaram muito sem graça, mas o pastor tomou a iniciativa de responder: – Poderemos dar qualquer peça que desejarem e não precisarão pagar, mas a debaixo não podemos porque não usamos.
Assim, desolados, o casal partiu novamente em busca do tão almejado talismã.
Cansados, exaustos mesmo, resolveram voltar para casa e em seu caminho de volta passaram pela floresta onde habitava o sábio eremita. Contaram-lhe toda a história e sobre como estavam decepcionados por voltarem para casa sem seu talismã. Fracassamos em tudo e por tudo.
Novamente, pacientemente, depois de ouvir toda narração o sábio perguntou:
– Acham mesmo que fracassaram? E a experiência que adquiriram ao longo dessa jornada? De nada valeu?
Ao que o príncipe respondeu:
– Certamente valeu. Aprendi que a felicidade plena de um casamento, não está no mundo, não está nas coisas, e uma benção que se recebe, de graça.
E a princesa completou:
– Aprendi que a felicidade não é um estado temporário, mas uma condição permanente, não está no estar, mas no ser.
O jovem casal novamente trocou um olhar cheio de amor. O sábio os abençoou e disse:
– Vocês encontraram seu talismã, ele está bem dentro de vocês, guarde-o com todo o cuidado, assim a discórdia, a infelicidade, a tristeza, não tomaram conta de vocês durante toda suas vidas, não importa o quanto durem.