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150 anos da morte de H. C. Andersen

4 de Agosto de 2025 às 12:21

Diretora, professora, Ph.D. Ana Maria Martins da Costa Santos Langkilde, e
Diretor de Comunicação, mag.art. Niels Jørgen Langkilde, ex-membro do Parlamento
Instituto H. C. Andersen
Marília, Estado de São Paulo, Brasil


 

No dia 4 de agosto de 2025, completam-se 150 anos da morte de H. C. Andersen. A data será lembrada com um culto na Catedral de Odense — a igreja onde ele foi confirmado e onde o jovem pensava mais nos seus primeiros sapatos novos do que na própria cerimônia de confirmação. Ele sabia que era errado e pediu perdão por isso.

Também no Brasil ele será homenageado. Uma conferência em São Paulo, organizada em parceria por diversas universidades, abordará desde problemas de tradução até possibilidades de interpretação e a importância das ilustrações na difusão dos contos. Participam palestrantes e convidados da Dinamarca, Bulgária, Itália e, naturalmente, do Brasil.
 

Por que ainda vale a pena manter viva a memória de H. C. Andersen tantos anos após sua morte? Nenhum outro autor de sua época continua sendo lido e adaptado em tantos meios e formatos. Há algo realmente único no autor mais conhecido da Dinamarca. Por isso, é essencial mantermos vivo o trabalho com sua vasta obra e com sua própria vida. Na Dinamarca, temos um patrimônio raro: um escritor antigo que ainda serve como referência comum entre diferentes gerações. Isso é extraordinário. Infelizmente, o mesmo não se pode dizer do tratamento dado à sua obra.



 

O funeral em 11 de agosto de 1875 reuniu estudantes e trabalhadores, a burguesia, a realeza representada pelo rei e pelo príncipe herdeiro, além de políticos e nobres. Todos estavam presentes. O funeral na Catedral de Copenhague foi um evento nacional grandioso. Era algo que a Dinamarca precisava vivenciar em unidade, especialmente após a trágica derrota na guerra de 1864. H. C. Andersen, no entanto, não chegou a ver o reconhecimento nacional que tanto buscou em vida. Sempre foi alvo de muitas críticas. Estar na mídia também não era algo fácil no século XIX.
 

O jornal Dagbladet registrou: “No coro estavam os acadêmicos, centenas deles, com suas bandeiras, e ao longo dos corredores, postavam-se a Associação de Trabalhadores de 1860, várias outras associações e os corais de Copenhague, também com bandeiras.” H. C. Andersen era um autor que abraçava a todos, e suas ligações com o início do movimento operário não devem ser esquecidas, embora frequentemente sejam. Ele sempre manteve relações com os mais vulneráveis da sociedade e foi um verdadeiro embaixador da responsabilidade social cristã fundamental.
 

Outra observação importante sobre o funeral: houve a participação de mulheres, algo impensável nas cidades no início daquele século. Por exemplo, quando Johan Ludvig Heiberg faleceu em 1856, nenhuma mulher participou do funeral — nem mesmo sua esposa, Johanne Louise Heiberg. No mesmo ano de sua morte, Andersen participou de outro funeral em que apenas homens estiveram presentes. No caso do seu próprio funeral, as mulheres da família real não compareceram, mas enviaram belas coroas de flores.
 

A cerimônia foi conduzida pelo cônego P. C. Rothe e o bispo de Odense, C. T. Engelstoft, fez um discurso. Os hinos escolhidos foram preservados. Carl Ploug compôs um hino para a ocasião e também foi utilizado um hino do próprio Andersen, que termina assim:
 

“Diminui minha dor na transformação,
Concede-me a coragem de uma criança,
Julga pensamentos, julga ações,
Com graça, com amor paternal.
Afasta meu medo! Que eu veja apenas a ti!
Em nome de Jesus, que tua vontade se cumpra!”

 

A recepção positiva a Andersen, porém, durou pouco. E curiosamente, quem reacendeu as críticas foi justamente o herdeiro literário de Andersen, Edvard Collin, com o livro H. C. Andersen e a Casa Collin, de 1882. Nele, Collin deixa claro que nunca quis ser íntimo de Andersen, embora o tenha ajudado enormemente ao longo da vida. A família Collin também recebeu muito em troca: leituras, músicas, empréstimos, manuscritos e viagens. Mas Collin sentiu a necessidade de criticar duramente seu amigo mundialmente famoso — uma tendência que muitos seguiram depois, como os críticos P. Hansen e Georg Brandes.
 

Seria uma excelente política literária investir mais em literatura clássica. No caso de Andersen, deveria ser criada a proposta de um Dicionário Andersen, como sugerido pelo principal pesquisador da obra do autor, dr. phil. Johan de Mylius. Isso facilitaria imensamente os trabalhos de tradução. Ainda hoje surgem versões com grandes erros de linguagem. Aqui no Brasil, por exemplo, Hyldemor virou “Dona Espiga de Milho”, e O Patinho Feio já foi traduzido como “O Patinho Verde”.
 

Se quisermos utilizar a literatura internacionalmente, H. C. Andersen é a chave. Ele abre portas. Representa a consciência social que o mundo clama, a integridade que tanto desejamos e uma crítica à autoridade e aos governantes tolos, mais preocupados com seu próprio bem-estar do que com o bem comum. Isso está presente de As Roupas Novas do Imperador até O Príncipe Malvado. Ele era otimista quanto à ciência e à técnica, mas crítico ao poder do dinheiro. Em países onde críticas sociais não são bem-vindas, Andersen entra “de tamancos”, com simplicidade. E inspira onde a mobilidade social está florescendo.
 

Em vez disso, nosso governo corta os poucos leitores dinamarqueses no exterior — aqueles que divulgam Andersen, outros autores e a cultura dinamarquesa pelo mundo. Isso deveria ser uma prioridade. Também deveria ser mais fácil manter sociedades literárias sem enfrentar taxas bancárias e de envio exorbitantes.
 

É positivo que se discuta a isenção de impostos sobre livros, como já ocorre em vários países. Também é bom incentivar o canto matinal nas escolas e nos locais de trabalho. Atualizar o cânone literário é uma excelente iniciativa. Mas é triste ver os estudos de literatura dinamarquesa definhando, com poucos alunos e parcos recursos. A grande arte de Andersen está diretamente ligada à sua compreensão da linguagem e da importância da literatura. Ele sabia expressar nossa existência, criar novas palavras e perspectivas, e discutir questões existenciais sem transformar isso em programa partidário. Sua obra é espírito e experiência em alto nível.
 

Nos tempos de crise e guerra de hoje, é fácil compreender Andersen quando ele escreve sobre amar a pátria e sobre as perdas sofridas durante as guerras dos Ducados de Schleswig. Ainda assim, ele teve de lutar contra a acusação de não ser “nacional o suficiente”. Era muito querido nos países de língua alemã, que travaram guerra contra a Dinamarca. Mesmo rompendo com essas amizades durante os conflitos, para muitos dinamarqueses, isso não foi suficiente.
 

Andersen entendeu bem como a guerra rompe relações, mais do que muitas empresas dinamarquesas de hoje. Isso fica evidente em seu diário de 1º de junho de 1867, ao viajar de trem pela Alemanha:
 

“...Perto de Gießen, percebi que o Grão-Duque de Weimar estava no mesmo trem, junto com seu acompanhante, que também conhecia — embora não me lembrasse do nome. Foi doloroso não poder sair e apertar sua mão. Não sabia como ele me receberia, nem como eu mesmo me sentiria depois por ter seguido minha emoção. Por isso, fechei firmemente a cortina da janela toda vez que ele passava...”
 

Um ano antes da morte de Andersen, seu velho amigo, o Grão-Duque Herdeiro de Saxe-Weimar-Eisenach, Carl Alexander, restabeleceu contato com um telegrama em 17 de abril de 1874, perguntando com gentileza sobre sua saúde. Andersen ficou muito feliz. A conexão interrompida pela guerra de 1864 foi, assim, discretamente retomada.
 

Mesmo no escuro provocado por essa guerra, encontramos a sua poesia. No hinário da Igreja Luterana, o hino 502 começa assim:
 

“Eu tenho um medo como nunca antes,
Como se estivesse diante da porta da morte
E precisasse entrar e cair
Na escuridão e na solidão.
Sou empurrado com a força de uma tempestade.
Ó Senhor, Senhor, segura-me firme.”

 

Hoje, o trabalho com a literatura clássica de Andersen depende fortemente de fundos privados, como ocorre com Kierkegaard, Grundtvig, Kaj Munk e outros. Nenhum dos centros de pesquisa dedicados a esses autores é suficientemente financiado pelo poder público. Estudar a língua e a literatura dinamarquesa não deveria ser um caminho sem futuro.

Autor:
Niels Jørgen Langkilde
Ilustração:
IHCA
Fonte:
https://institutohcandersen.com/
Contribuição:
Diretora, professora, Ph.D. Ana Maria Martins da Costa Santos Langkilde, e Diretor de Comunicação, mag.art. Niels Jørgen Langkilde, ex-membro do Parlamento